Ribeirão Preto-SP, em 20 de setembro de 2017.
Excelentíssimo Advogado
Prof. Dr. CIRO FERREIRA GOMES
(em mãos)
Excelentíssimo Senhor:
Este Sindicato dos Advogados do Interior Paulista-SINDADV vem sugerir a Vossa Excelência que, em plano de campanha à Presidência da República, perfilhe tema de imane relevância à classe trabalhadora, tema esse proposto (OFÍCIO TRT/GAB VJMF/Nº 036/2012 Belém-PA 23.out.2012) pelo Excelentíssimo Desembargador Dr. JOSÉ MALHEIROS DA FONSECA, do Tribunal Regional do Trabalho da 8ª Região (Pará/Amapá) ao Excelentíssimo Ministro Corregedor ANTÔNIO JOSÉ DE BARROS LEVANHAGEN, cujos verbos são transcritos ipsis verbis et litteris na presente missiva.
O tema trata de medidas que visam à celeridade do processo trabalhista, notadamente a prolação de sentença líquida, prática essa, aliás, implementada em caráter pioneiro no âmbito daquel TRT 8ª Região, que agiliza bastante o processo trabalhista, porque evita impugnações, embargos do devedor e recursos em torno do quantum debeatur, o que deverá ser acompanhado de drástico enxugamento do sistema recursal no âmbito da Justiça Laboral, cujo procedimento de execução de sentença, além dos eficientes mecanismos oferecidos pela informática, como a penhora on line (SISBACEN e outros), carece de aperfeiçoamentos.
Neste particular, como defende o Desembargador MALHEIROS DA FONSECA, a eficácia das sentenças trabalhistas é tema de grande preocupação, desde logo porque não raro o sucesso, na fase de conhecimento, transforma-se em autêntica vitória de Pirro, na fase de execução.
Outro tema que se propõe a Vossa Excelência diz respeito às verbas do Fundo de Garantia por Tempo de Serviço-FGTS e sua consideração nestas execuções, a cujo respeito a EC nº 45/2004, que dispõe sobre a Reforma do Poder Judiciário, aprovou um importante mecanismo para tornar o processo trabalhista mais eficiente e célere, cujo art. 3º estabelece que “a lei criará o Fundo de Garantia das Execuções Trabalhistas, integrado pelas multas decorrentes de condenações trabalhistas e administrativas oriundas da fiscalização do trabalho, além de outras receitas”.
Para o Desembargador MALHEIROS DA FONSECA, a sociedade brasileira e os magistrados trabalhistas, em especial, alimentam a esperança de que a regulamentação do FUNDO DE GARANTIA DAS EXECUÇÕES TRABALHISTAS-FUNGET, por via de lei ordinária, seja implementada com as cautelas necessárias para não se desviar dos propósitos que justificam a criação do novo modelo processual trabalhista.
A propósito, a idéia original do FUNGET tem sido debatida e aprovada em conclaves jurídicos, inclusive no XII Congresso Nacional de Magistrados da Justiça do Trabalho (2004) e na Jornada Nacional sobre Execução Trabalhista (2010).
Tramitam no Congresso Nacional três Projetos de Leis para regulamentar a matéria (PL 4.597/2004, PLS 246/2005 e PL 6.541/2006), daí a necessidade de conciliar divergências no sentido de encontrar a fórmula capaz de efetivar o comando constitucional, tal como foi idealizado.
O proponente adverte, neste ponto, ser de todo aconselhável defender a aprovação do Projeto de Lei nº 246/2005, de autoria da então Senadora ANA JÚLIA CAREPA (PT-PA), que difere em muitos pontos do PL nº 6.541/2006, proposto pela Comissão Especial Mista de Regulamentação da EC 45/2004, inclusive quanto à gestão do Conselho Curador do FUNGET, que deverá ser presidido por representante da Justiça do Trabalho e administrado pelo Ministério Público do Trabalho, órgãos que melhor se adequam a tarefas de gerenciamento do sistema.
Afinal, o processo trabalhista foi concebido para ser simples, informal, concentrado, oral e célere, em todas as etapas, jamais um fim em si mesmo, mas se a sentença ou a conciliação não for cumprida, segue-se a fase de execução, um dos “calcanhares de Aquiles” na Justiça do Trabalho.
No momento crucial do processo, a efetividade do título executivo é quase nenhuma, porque quase nada obedece aos princípios basilares do processo moderno.
Desde o momento histórico em que o devedor deixou de responder com o seu próprio corpo pelas dívidas civis (salvo ação de alimentos e depositário infiel), essa responsabilidade transferiu-se para o seu patrimônio, em caso de execução. Daí a penhora sobre bens do devedor, para efeito de alienação, em praça ou leilão, e posterior pagamento para satisfação do direito do credor, como assegurado no título executivo judicial ou extrajudicial.
Acontece que esse sistema complexo de execução, desde o direito romano, já não atende às expectativas do credor trabalhista, geralmente hipossuficiente e desempregado.
Na Espanha, adota-se, com sucesso, o “Fondo de Garantía Salarial”, que funciona da seguinte forma: se houver recurso da empresa contra condenação a título de salários, pode, o trabalhador, levantar de imediato o valor correspondente, perante o “Fondo”; improvido o apelo, o obreiro já teve antecipado o seu pagamento; provido o recurso patronal, o “Fondo” se incumbe de cobrar do trabalhador e ressarcir o empregador.
Adaptando-se a idéia à realidade nacional, nosso FUNGET somente poderá ser movimentado após o trânsito em julgado da decisão.
Se houver recurso, a execução poderá estar garantida com o depósito recursal.
Não havendo pagamento, o juiz determinará a movimentação do FUNGET – que se destina a assegurar qualquer crédito trabalhista, e não apenas os salários, como na Espanha -, para pagamento imediato ao credor, que terá satisfeito, de modo rápido, o seu direito.
Em seguida, o FUNGET, sub-rogando-se no crédito do trabalhador, passa a executar o devedor, perante a Justiça do Trabalho, mediante sanções severas, inclusive com imposição de astreintes (dia-multa), para evitar a sua movimentação constante e inevitável descapitalização.
Conforme o art. 2º do PLS 246/2005 o FUNGET é constituído pelos depósitos a que se refere esta lei, pelas multas impostas por sentenças ou ajustadas em acordos nos processos trabalhistas, e ainda pelas multas administrativas resultantes da fiscalização do trabalho, além de outros recursos a ele incorporados, devendo ser aplicados com atualização monetária e juros, de modo a assegurar a cobertura de suas obrigações.
A Justiça do Trabalho proporciona expressiva arrecadação de custas, contribuições previdenciárias e imposto de renda, além dos depósitos recursais efetuados na conta vinculada do FGTS. Há sentenças que determinam o recolhimento de multas e indenizações – como é o caso de dano moral coletivo resultante do trabalho escravo ou degradante – para o Fundo de Amparo ao Trabalhador (FAT), que poderão doravante reverter para o FUNGET.
Haverá uma pequena contribuição patronal para o FUNGET, cujo custeio não decorre de verbas públicas. Em compensação, as empresas poderão utilizar-se, eventualmente, do fundo, para aplicação em programas que tragam benefícios diretos ou indiretos aos trabalhadores e seus familiares (creches, escolas, qualificação profissional, lazer etc.), desde que não causem a movimentação dos depósitos durante certo tempo.
Os empregadores adimplentes com o Fundo ainda receberão incentivos fiscais.
A idéia, fundada nos princípios da seguridade e que tem como premissa a função social da empresa, nas relações trabalhistas, atende aos pressupostos jurídicos da responsabilidade civil objetiva. A mesma tese que justifica o instituto do seguro prévio para garantir os infortúnios humanos, que não se limitam aos eventos da morte, do acidente, do incêndio, da doença e da aposentadoria, para os quais existem fundos que asseguram a cobertura de compensações para dependentes e segurados. Merecem ainda atenção os riscos decorrentes das relações de emprego, especialmente em favor dos desempregados e seus familiares, excluídos de uma vida mais digna, vítimas da crueldade que a sociedade vem se acostumando a assistir, quase insensível, senão indiferente.
Foi, pois, pensando nas agruras da espera pelo credor trabalhista, que o Desembargador MALHEIROS DA FONSECA intenta, assim, agilizar e tornar realmente efetiva uma das fases mais demoradas e penosas do processo do trabalho, ao lado do sistema recursal, que também carece de aperfeiçoamentos.
Não é suficiente que o crédito do trabalhador, reconhecido por sentença judicial, conserve o seu poder aquisitivo. Impõe-se que o empregador sofra as conseqüências severas por mora no cumprimento das obrigações resultantes da res judicata, proporcionalmente à gravidade social da sua atitude.
Daí justificar-se a adoção do sistema francês das astreintes, a se garantir, na execução da sentença trabalhista, o pagamento da dívida principal acrescida das sanções pecuniárias, impostas pelo juiz, à parte responsável pelo atraso na quitação das verbas reconhecidas pela decisão judicial, sem prejuízo dos juros e correção monetária.
Perceba Vossa Excelência que a criação do FUNGET constitui reformulação profunda e corajosa no nosso Direito Processual do Trabalho, pois é medida capaz de imprimir verdadeira antecipação da garantia das execuções trabalhistas, inclusive com apoio nos princípios da seguridade social.
O passo seguinte, com os calcanhares protegidos, deverá ser o enxugamento do sistema recursal na Justiça do Trabalho, sem o que o processo trabalhista, que se caracteriza pela celeridade na solução das demandas, continuará sujeito às delongas por diversos graus de jurisdição, longe, portanto, de atender os seus objetivos jurídicos e sociais.
Se a legislação ordinária já estabelece que “os Juízos e Tribunais do Trabalho terão ampla liberdade na direção do processo e velarão pelo andamento rápido das causas, podendo determinar qualquer diligência necessária ao esclarecimento delas”, atualmente constitui garantia constitucional “a razoável duração do processo e os meios que garantam a celeridade de sua tramitação” (art. 5º, LXXVIII, da Constituição Federal).
Assim aventadas tais idéias a Vossa Excelência, pede-se sua valiosa atenção para com os temas em proposição, que haverão de compor sua plataforma de governo sob a convicção de que, como arremata o Desembargador MALHEIROS DA FONSECA em seu supracitado ofício ao Ministro Corregedor BARROS LEVANHAGEN, ‘a real eficácia dos Direitos Humanos na Justiça do Trabalho somente estará concretizada quando o cumprimento ou a execução da sentença judicial ou da conciliação puder contar com mecanismos de acesso e efetividade à prestação jurisdicional rápida e justa.’
De resto, honre-nos Vossa Excelência, como colega e como aspirante ao cargo de Magistrado Mor da Nação, em recebendo nossos mais sinceros protestos de respeito e consideração.
SAUDAÇÕES DEMOCRÁTICAS
Sindicato dos Advogados do Interior Paulista-SINDADV
PAULO FERNANDO ORTEGA BOSCHI FILHO